quarta-feira, 13 de agosto de 2008

E se...


Recentemente tenho pensado um pouco na frágil relação entre nós e Deus. Frágil não somente pela diferença natural existente entre um Deus onisciente, onipotente e onipresente, imaterial, soberano e atemporal e os fragmentos de temporalidade chamados seres humanos, mas também pela complexidade, pra não dizer bagunça, psico-emocional que se revelam nossas iniciativas relacionais.
Basicamente travamos nossos relacionamentos com base em nossos interesses. Tais interesses se agrupam em duas categorias: preservação – aquilo que fazemos para nos mantermos vivos e estáveis, e felicidade – aquilo que agregamos à existência para nos tornarmos mais satisfeitos – como se isso fosse possível!
Esse egocentrismo quase genético, que define essencialmente os padrões de nossos relacionamentos, fragilizam nossas relações com nossos semelhantes, em primeira instância, mas muito mais, nossas relações com Deus.
Primeiramente, nos relacionamos com Deus por questão de autopreservação. Nossa primeira reação de nos atirarmos nos braços da divindade, é quase um reflexo diante da ameaça dos dois grandes inimigos da humanidade, a saber, a morte e o inferno. É diante da apresentação desses dois monstros aterrorizantes que nos propomos a buscar a Deus, afinal, o cenário de um lugar onde se ouve gemidos e ranger de dentes o tempo todo, com temperaturas extremas e paisagem flamejante, não agrada a ninguém. Daí, passamos a um estágio mais evoluído. Descobrimos que Deus não só nos propõe o livramento do inferno, mas também a possibilidade do céu – um lugar paradisíaco, isento de qualquer expressão de dor e maldade, onde a palavra que aparentemente o define é: recompensa.
Enfim, das duas uma. Ou servimos a Deus por medo do inferno, ou servimos a Deus em troca do céu. Alguns poucos, privilegiados, percebem que o que há de mais infernal no inferno é a ausência de Deus e o mais celestial do céu é a plenitude de Deus. E a partir daí constroem um novo tipo de relacionamento com Deus, baseado no amor.
No entanto, há que fazer justiça. Há um caminho a percorrer. Nossas crianças primeiro obedecem por medo da vara, depois pela possibilidade da bicicleta, e só depois, se foi construído um relacionamento suficientemente profundo, obedecem pelo prazer de ver o pai satisfeito. É assim conosco, a graça e a liberdade do amor, parecem fazer sentido somente após a causalidade e restrição da lei. O Deus, legislador moral da antiga aliança é o precursor do Pai de graça abundante da Nova Aliança. Não que o último invalida o primeiro, pelo contrário, o Pai nunca deixa de ser Deus. Mas conhecê-lo como Deus sem conhecê-lo como Pai, nos torna obedientes e moralmente responsáveis, mas priva-nos da verdadeira transformação do amor.
Portanto arrisco a pergunta: E se não houvesse céu? E se não houvesse inferno? Se não houvesse nem ameaças nem propostas, ainda o serviríamos? Essas respostas nos farão entender melhor em que ponto da estrada estamos.
 

.